terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Pra não dizer que não falei das flores




Geraldo Vandré

Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)

Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)

Há soldados armados
Amados ou não
Quase todos perdidos
De armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam
Uma antiga lição:
De morrer pela pátria
E viver sem razão...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)

Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Somos todos soldados
Armados ou não
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não...

Os amores na mente
As flores no chão
A certeza na frente
A história na mão
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Aprendendo e ensinando
Uma nova lição...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(4x)

Chão de estrelas


Silvio Caldas e Orestes Barbosa

Minha vida era um palco iluminado
E eu vivia vestido de dourado
Palhaço das perdidas ilusões
Cheio dos guizos falsos da alegria
Andei cantando minha fantasia
Entre as palmas febris dos corações

Meu barracão lá no morro do Salgueiro
Tinha o cantar alegre de um viveiro
Foste a sonoridade que acabou
E hoje, quando do Sol a claridade
Forra o meu barracão, sinto saudade
Da mulher, pomba-rola que voou

Nossas roupas comuns dependuradas
Na corda qual bandeiras agitadas
Pareciam um estranho festival
Festa dos nossos trapos coloridos
A mostrar que nos morros mal vestidos
É sempre feriado nacional.

A porta do barraco era sem trinco
Mas a lua furando nosso zinco
Salpicava de estrelas nosso chão
E tu pisavas nos astros distraída
Sem saber que a ventura desta vida
É a cabrocha, o luar e o violão

domingo, 6 de dezembro de 2009

Barracão de zinco


Luiz Antonio e Oldemar Magalhães

Ai barracão
Pendurado no morro
Vim pedindo socorro
A cidade aos seus pés
Ai barracão
Tua vida eu escuto
Não te esqueço um minuto
Hoje sei quem tu és
Barracão de zinco
Tradição do meu país
Barracão de zinco
Pobre é tão infeliz
Ai barracão
Pendurado no morro
Vim pedindo socorro
A cidade aos seus pés
Ai barracão
Tua vida eu escuto
Não te esqueço um minuto
Hoje sei quem tu és
Barracão de zinco
Tradição do meu país
Barracão de zinco
Pobre é tão infeliz
Ai barracão
Pendurado no morro
Vim pedindo socorro
A cidade aos seus pés
Ai barracão
Tua vida eu escuto
Não te esqueço um minuto
Hoje sei quem tu és
Barracão de zinco
Tradição do meu país
Barracão de zinco

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Inesquecível

Luiz Santos

Eu queria,
Não sentir mais saudades,
afastar esse tédio,
Expulsar meu tormento,
Não ter mais você,
em meu pensamento.
Dessa dor que se agrava,
no passar do tempo.
Eu queria,
Não ter mais arrepios quando lhe vejo,
Reviver emoções do calor do seu beijo.
De a sua voz ficar surdo
e o seu nome da mente desaparecer.

Eu queria,
Livrar-me desse inesquecível amor absurdo,
Que ao tempo venceu
e apenas eu, quem perdeu.
Ainda escravo desse sentimento sofrido,
Eu lamento não poder esquecer,
Porque ele tão forte sobrevive,
a minha vontade de ser.
Meu coração suplica espaço,
apagar o passado,
Desse amor, que só por mim foi amado
E a esperança de merecer.
Sua lembrança é como o castigo que carrego comigo,
Só porque ainda hoje,
Eu amo você.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Medo

Virgínia Victorino


Ouve o grande silencio destas horas!
Há quanto tempo não dizemos nada ...
Tens no sorriso uma expressão magoada,
tens lágrimas nos olhos, e não choras!

As tuas mãos nas minhas mãos demoras
numa eloqüência muda, apaixonada ...
Se o meu sombrio olhar de amargurada
procura o teu, sucumbes e descoras ...

O momento mais triste de uma vida
é o momento fatal da despedida,
- Vê como o medo cresce em mim, latente ...

Que assustadora, enorme sombra escura!
Eis afinal, amor, toda a tortura:
- vejo-te ainda, e já te sinto ausente!

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Insegura

Luiz Santos

Minha solene jura
Não foi impura,
Quando disse lhe amar, Se quer
Foi apenas momento.
Novamente lhe juro lamento,
Não acreditar em mim.
Fiel aos meus conceitos,
Certo de não ser defeito,
Muito menos engano.
Como gotas do oceano,
Impossível contar.
Meu amor é assim.

Confesso no principio, foi paixão.
Mas, a dor do coração,
Mudou minha opinião.
Pensei, até mesmo desistir,
Quando o amor fala mais alto,
Não tem como intervir.
Talvez fosse melhor para nós dois.
Nada disso acontecer
Você, tão descrente de mim.
E eu, amando você.

Guardo no bolso as alianças
E no peito a esperança.
Até quando, de idéia mudar. Até lá.
Vou seguindo sozinho
Do caminho tirando os espinhos.
O destino; vai ter que explicar.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Rabiscos de uma existencia

Betânia Uchôa

No ensaio de minha vida
sempre descubro
que sou de muitas facetas
muitas mulheres buscando ser uma
várias fatias de um mesmo bolo
sou a menina crescida,
a revolucionária escondida
a amiga que te consola
a médica que te cura
a professora que te ensina
a estudante que aprende com a vida
a voz que te embala, canto da alegria
sou a estrela no palco de minha vida
mas sou a estrela da vida de alguém
sou alma , sou calma...
sou riso, risada...um grito.
sou a voz no silêncio...
sou a noite, lua cheia...
olhos negros, uma gata...
sou loba, fera a solta...
sou a dança de rua
a cientista, sou neguinha
sou mulher...
sou a que ama com loucura,
que te acolhe num abraço...
sou a que é amada com loucura
sou a que se saceia com seu amor...
tantas de mim...
sou rabiscos, folhas soltas...
sou linhas retas ou tortas
nas inumeras páginas
de minha existencia...
.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Biologia do amor

Luiz Santos

Nunca imaginei o poder da imagem,
O domínio atraente.
Que faz o olhar perseguir,
sem sentir,
A ordenação,
que vem da mente.
A hipnose envolvente fascina
Como ato eloqüente de pura magia,
Penetra nos olhos atravessa a retina
E atinge a alma da gente.
Percorrendo a corrente sangüínea,
Acelera a emoção,
Chega ao coração e faz pulsar a paixão.
Segue em frente, de volta a mente.
Transforma em energia dos neurônios.
Os hormônios ao corpo irradiam.
A imagem se faz simpatia prover
Ornada em beleza,
Tudo perfeito se vê.
Assim nasce o amor.
Em mim.
Em você.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Amor vadio

Márcia Rocha

Estranha a força que me domina;
nunca poderei entender...
dos versos que teço agora;
São só para te enlouquecer...

Dos redemoinhos que me encontro;
da paz que procuro achar...
teu vulto me vem distante;
voltando a me desabar.

Sem ti... sinto-me perdida...
contigo, dor lascinante...
o que me aguarda da vida;
sem teu olhar fascinante.

Felicidade distante...
coração chorando e sorrindo;
nada sei...nada sou...
nada entendo...
desse estranho amor vadio.

Pesa tanto e a vida é tão breve;
minha alma a tua sombra leve!
Derrama no meu coraçâo...
a tua incerteza que fere.

18/11/2008

sábado, 15 de agosto de 2009

Valsar com a vida

Alberto da Fonseca

Ò vida minha
Que te amo tanto
Tu és tão meiguinha
Numa valsa dançando.
Um passo para trás
Dois para a frente
Ope lá!
Uma voltinha
Uma segunda
E uma terceira
Uma quarta ainda
Ò minha vida
Tu és tão lindinha.

A morte estava sentada
Ao canto, no seu lugar
Fizemos-lhe um careta
E fomos os dois valsar.
Um passo para trás
Dois para a frente
Ope lá!
Uma voltinha
Uma segunda
E uma terceira
Uma quarta ainda,
Ò minha vida
Tu és Rainha.

À noite fomos para a cama
Para nos irmos deitar
Mas tu com a tua chama
Preferiste ir valsar.
Um passo para trás
Dois para a frente
Ope lá!
Uma voltinha
Uma segunda
E uma terceira
Uma quarta ainda.
Ò minha vida
Tu és Joaninha.

E pela vida fora
Foi sempre a dançar
E até à aurora
Era só valsar.
Um passo para trás
Dois para a frente
Ope lá!
Uma voltinha
Uma segunda
E uma terceira
E uma quarta ainda.
Ò minha vida
Tu és andorinha!

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Lágrima

Amália Rodrigues

Cheia de penas me deito
E com mais penas me levanto
Já me ficou no meu peito
O jeito de te querer tanto.

Tenho por meu desespero
Dentro de mim o castigo
Eu digo que não te quero
E de noite sonho contigo.

Se considero que um dia hei-de morrer
No desespero que tenho de te não ver
Estendo o meu xale no chão
E deixo-me adormecer.

Se eu soubesse que morrendo
Tu me havias de chorar
Por uma lágrima tua
Que alegria me deixaria matar.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Acordes poéticos

Julia da Costa

Não tenho segredos, é pura minh´alma,
Qual cândida aurora rasgando o seu véu!
Velando ou dormindo, chorando ou sorrindo,
Só amo – meus campos – meu solo – meu céu!

Cresci sobre um ermo tristonho e sombrio,
Soltei nas campinas meu primo cantar,
Saudei nas montanhas o sol que nascia,
Brinquei entre moitas ao claro luar!

Sou jovem, sou meiga, sorri-me o futuro
Nas fímbrias douradas de auroras de paz,
A flor das campinas só ama o infinito
Do céu, das venturas, não quer nada mais!

As flores dos prados não causam-me inveja,
Que hei flores mimosas no meu coração!
Lauréis e grandezas, eu não, não aspiro,
Não quero ter gozo tão falso, tão vão!

Não tenho segredos, é pura minh´alma,
Qual cândida aurora rasgando o seu véu!
Velando ou dormindo, chorando ou sorrindo,
Só amo – meus campos – meu solo – meu céu!
.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Amor + ação = doação...

TÅRSØ
CAVÅ£ËÎRØ


Como poeta me fiz doação...a você !
Me despi de minhas emoções
me fiz coração
me inspirei no seu mundo
me arrisquei no meu salto
Me traduzi em letras...em sonetos
Aliviei minha bagagem...mostrei meu
carinho
Fui histórias sem fim
Como humano...me doei em vida de
corpo
Fiz escolhas de salvar,
num futuro quem sabe Deus,

____alguém !!

Vou doar tudo que tenho
ou tudo que foi me dado
vou devolver ao Pai aquilo
que cuidei com amor
que por amor recebi
Darei de mim...cada pedaço

____para que seja amado de novo

Darei meu sangue como ouro
meus olhos serão farois de outra vida
meu coração motor de outra fonte
Só por amor poderei fazer escolhas

____seria loucura ?

Quero salvar uma vida que seja
pois para quem está na espera
um ato é tudo que posso executar
Como humano me dispo de todas minha
vontades
Se a ciência atingiu esse nivél de
conhecimento...devo partilhar
em amor

ajudando-a vencer a morte !!

Páginas em branco

Luiz dos Santos

Folheando meu caderno da vida,
Descobri algumas páginas em branco.
Tentei lembrar a razão
E até mesmo perguntar-me,
O por quê?
Curioso, desfolhei mais ainda,
Em busca de uma resposta.
Não me decepcionei,
Quando nada encontrei.
Na verdade, achei bem melhor,
Porque sei seria pior,
Se tudo ficasse escrito.
Na vida, nem tudo deve ser relido.
Por isso o tempo apaga,
O que deve ser esquecido.

Pensei no aproveito
Das páginas em branco,
Mas um tranco impediu-me o intento
No momento em que li
Naquelas páginas em branco,
Que o ensinamento da vida,
É o exemplo,
Das páginas em branco vividas.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Doutrina de amar

Luiz Santos

Tua ternura acalma,
Tal qual a flor,
Suavidade da alma.
Brandura cristalina
Emanante brilha,
A luz reluzente
Transparente energia.
Que és guia permanente,
Que trilha.
Que o equilíbrio conduz
A serenidade sutil,
A um mero servil,
Ser gentil. Não faz diferença à nobreza.
Que a riqueza é a pureza divina,
Que ensina a doutrina de amar;
Aos outros como o próprio eu,
Não aos meus, nem aos teus.
Mas todos, que em ti assemelha.
Porque também és,
Do teu Deus.
A centelha.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Minha Musa

Machado de Assís

A MUSA, que inspira meus tímidos cantos,
É doce e risonha, se amor lhe sorri;
É grave e saudosa, se brotam-lhe os prantos.
Saudades carpindo, que sinto por ti.

A Musa, que inspira-me os versos nascidos
De mágoas que sinto no peito a pungir,
Sufoca-me os tristes e longos gemidos
Que as dores que oculto me fazem trair.

A Musa, que inspira-me os cantos de prece,
Que nascem-me d’alma, que envio ao Senhor.
Desperta-me a crença, que às vezes ‘dormece
Ao último arranco de esp’ranças de amor

A Musa, que o ramo das glórias enlaça,
Da terra gigante - meu berço infantil,
De afetos um nome na idéia me traça,
Que o eco no peito repete: - Brasil!

A Musa, que inspira meus cantos é livre,
Detesta os preceitos da vil opressão,
O ardor, a coragem do herói lá do Tibre,
Na lira engrandece, dizendo: - Catão!

O aroma de esp’rança, que n’alma recende,
É ela que aspira, no cálix da flor;
É ela que o estro na fronte me acende,
A Musa que inspira meus versos de amor!

domingo, 21 de junho de 2009

O corvo

Edgard Allan Poe
(tradução: Fernando Pessoa)



O CORVO

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de alguém que batia levemente a meus umbrais
«Uma visita», eu me disse, «está batendo a meus umbrais.
É só isso e nada mais.»

Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P'ra esquecer (em vão) a amada, hoje entre hostes celestiais —
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,
Mas sem nome aqui jamais!
Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundindo força, eu ia repetindo,
«É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.
É só isso e nada mais».

E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,
«Senhor», eu disse, «ou senhora, decerto me desculpais;
Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,
Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,
Que mal ouvi...» E abri largos, franquendo-os, meus umbrais.
Noite, noite e nada mais.

A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,
Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.
Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,
E a única palavra dita foi um nome cheio de ais —
Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.
Isto só e nada mais.

Para dentro estão volvendo, toda a alma em mim ardendo,
Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.
«Por certo», disse eu, «aquela bulha é na minha janela.
Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais.»
Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.
«É o vento, e nada mais.»

Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,
Mas com ar solene e lento pousou sobre meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais.
Foi, pousou, e nada mais.

E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura
Com o solene decoro de seus ares rituais.
«Tens o aspecto tosquiado», disse eu, «mas de nobre e ousado,
Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!
Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais.»
Disse-me o corvo, «Nunca mais».

Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,
Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.
Mas deve ser concedido que ninguém terá havido
Que uma ave tenha tido pousada nos seus umbrais,
Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,
Com o nome «Nunca mais».

Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,
Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.
Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento
Perdido, murmurei lento, «Amigo, sonhos — mortais
Todos — todos lá se foram. Amanhã também te vais».
Disse o corvo, «Nunca mais».

A alma súbito movida por frase tão bem cabida,
«Por certo», disse eu, «são estas vozes usuais.
Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono
Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,
E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais
Era este «Nunca mais».

Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;
E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira
Que qu'ria esta ave agoureira dos maus tempos ancestrais,
Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,
Com aquele «Nunca mais».

Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo
À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,
Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando
No veludo onde a luz punha vagas sombras desiguais,
Naquele veludo onde ela, entre as sombras desiguais,
Reclinar-se-á nunca mais!

Fez-me então o ar mais denso, como cheio dum incenso
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.
«Maldito!», a mim disse, «deu-te Deus, por anjos concedeu-te
O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,
O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».

«Profeta», disse eu, «profeta — ou demónio ou ave preta!
Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais,
Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida
Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».

«Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!, eu disse. «Parte!
Torna à noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!
Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!
Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».

E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha dor de um demónio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão mais e mais,
E a minh'alma dessa sombra, que no chão há mais e mais,
Libertar-se-á... nunca mais!

sábado, 20 de junho de 2009

O anos são degraus

Maria Fernanda de Castro



Os anos são degraus; a vida, a escada.
Longa ou curta, só Deus pode medi-la.
E a Porta, a grande Porta desejada,
só Deus pode fechá-la,
pode abri-la.


São vários os degraus: alguns sombrios,
outros ao sol, na plena luz dos astros,
com asas de anjos, harpas celestiais;
alguns, quilhas e mastros
nas mãos dos vendavais.


Mas tudo são degraus; tudo é fugir
à humana condição.
Degrau após degrau,
tudo é lenta ascensão.


Senhor, como é possível a descrença,
imaginar, sequer, que ao fim da estrada
se encontre após esta ansiedade imensa
uma porta fechada
— e nada mais?

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Além da Imaginação

Ulisses Tavares



Tem gente passando fome.
E não é a fome que você imagina
Entre uma refeição e outra.
Tem gente passando frio.
E não é o frio que você imagina
Entre o chuveiro e a toalha.
Tem gente doente.
E não é a doença que você imagina
Entre a receita e a aspirina.
Tem gente sem esperança.
E não é o desalento que você imagina
Entre o pesadelo e o despertar.
Tem gente pelos cantos.
E não são os cantos que você imagina
Entre o passeio e a casa.
Tem gente sem dinheiro.
E não é a falta que você imagina
Entre o presente e a mesada.
Tem gente pedindo ajuda.
E não é aquela que você imagina
Entre a escola e a novela.
Tem gente que existe e parece
imaginação.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

O Mundo é Um Moinho

Cartola


Ainda é cedo amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que iras tomar

Preste atenção querida
Embora eu saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és

Ouça-me bem amor
Preste atenção o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho.
Vai reduzir as ilusões à pó

Preste atenção querida
Em cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavastes com teus pés

quarta-feira, 20 de maio de 2009

O sorriso do jardim

Algum jardim já sorriu para você?
pergunto porque hoje um sorriu para mim.
não foi sorriso triste ou maroto,
de quem reclama da falta de chuva
ou da pouca luz do sol do mês de maio.
Foi um sorriso feliz, como quem diz:
"Veja como minha grama está verde,
veja como tenho flores belas.
A grama só precisa de um pouco d'água
e as flores só florescem nesta época do ano."

Algum jardim já sorriu para você?
pergunto porque hoje um sorriu para mim
e mostrou que, apesar da secura de sentimentos,
dos escassos motivos pra sorrir,
só preciso de pouco para ser feliz.
Retribuir uma palavra gentil ou um sorriso,
sonhar com o amanhã, quando haverá
alguém para compartilhar sonhos
e que rirá de minhas tolices.

Alguém a quem perguntarei:
algum jardim já sorriu para você?
pergunto porque hoje um sorriu para mim,
e me responderá que o jardim também lhe sorriu.

(humbrto o sousa)

domingo, 10 de maio de 2009

Desbloqueio

 

A mais de um mês que não consigo escrever,

problemas de mais, tempo de menos,

talvez se tentasse temas amenos,

textos pequenos.

 

Cada palavra tem que ser escavada,

não com as mãos nuas,

mas com enxada.

 

E desta maneira vou descobrindo,

sob os sedimentos

novos sentimentos

e velhos tormentos.

 

Quem sabe descubra um novo eu,

perdido e enterrado no fundo

de uma alma toda arranhada.

 

(humberto o sousa) 

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Faroeste Caboclo

Composição: Renato Russo


Não tinha medo o tal João de Santo Cristo
Era o que todos diziam quando ele se perdeu
Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda
Só pra sentir no seu sangue o ódio que Jesus lhe deu

Quando criança só pensava em ser bandido
Ainda mais quando com um tiro de soldado o pai morreu
Era o terror da sertania onde morava
E na escola até o professor com ele aprendeu

Ia pra igreja só prá roubar o dinheiro
Que as velhinhas colocavam na caixinha do altar
Sentia mesmo que era mesmo diferente
Sentia que aquilo ali não era o seu lugar

Ele queria sair para ver o mar
E as coisas que ele via na televisão
Juntou dinheiro para poder viajar
De escolha própria, escolheu a solidão

Comia todas as menininhas da cidade
De tanto brincar de médico, aos doze era professor.
Aos quinze, foi mandado pro o reformatório
Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror.

Não entendia como a vida funcionava
Discriminação por causa de sua classe ou sua cor
Ficou cansado de tentar achar resposta
E comprou uma passagem, foi direto a Salvador.

E lá chegando foi tomar um cafezinho
E encontrou um boiadeiro com quem foi falar
E o boiadeiro tinha uma passagem e ia perder a viagem
Mas João foi lhe salvar

Dizia ele: "Estou indo pra Brasília
Neste país lugar melhor não há
Estou precisando visitar a minha filha
Eu fico aqui e você vai no meu lugar"

E João aceitou sua proposta
E num ônibus entrou no Planalto Central
Ele ficou bestificado com a cidade
Saindo da rodoviária, viu as luzes de Natal

"Meu Deus, mas que cidade linda,
No Ano-Novo eu começo a trabalhar"
Cortar madeira, aprendiz de carpinteiro
Ganhava cem mil por mês em Taguatinga

Na sexta-feira ia pra zona da cidade
Gastar todo o seu dinheiro de rapaz trabalhador
E conhecia muita gente interessante
Até um neto bastardo do seu bisavô

Um peruano que vivia na Bolívia
E muitas coisas trazia de lá
Seu nome era Pablo e ele dizia
Que um negócio ele ia começar

E o Santo Cristo até a morte trabalhava
Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar
E ouvia às sete horas o noticiário
Que sempre dizia que o seu ministro ia ajudar

Mas ele não queria mais conversa
E decidiu que, como Pablo, ele ia se virar
Elaborou mais uma vez seu plano santo
E sem ser crucificado, a plantação foi começar.

Logo logo os maluco da cidade souberam da novidade:
"Tem bagulho bom ai!"
E João de Santo Cristo ficou rico
E acabou com todos os traficantes dali.

Fez amigos, freqüentava a Asa Norte
E ia pra festa de rock, pra se libertar
Mas de repente
Sob uma má influência dos boyzinho da cidade
Começou a roubar.

Já no primeiro roubo ele dançou
E pro inferno ele foi pela primeira vez
Violência e estupro do seu corpo
"Vocês vão ver, eu vou pegar vocês"

Agora o Santo Cristo era bandido
Destemido e temido no Distrito Federal
Não tinha nenhum medo de polícia
Capitão ou traficante, playboy ou general

Foi quando conheceu uma menina
E de todos os seus pecados ele se arrependeu
Maria Lúcia era uma menina linda
E o coração dele pra ela o Santo Cristo prometeu

Ele dizia que queria se casar
E carpinteiro ele voltou a ser
"Maria Lúcia pra sempre vou te amar
E um filho com você eu quero ter"

O tempo passa e um dia vem na porta
Um senhor de alta classe com dinheiro na mão
E ele faz uma proposta indecorosa
E diz que espera uma resposta, uma resposta do João

"Não boto bomba em banca de jornal
Nem em colégio de criança isso eu não faço não
E não protejo general de dez estrelas
Que fica atrás da mesa com o cú na mão

E é melhor senhor sair da minha casa
Nunca brinque com um Peixes de ascendente Escorpião"
Mas antes de sair, com ódio no olhar, o velho disse:
"Você perdeu sua vida, meu irmão"

"Você perdeu a sua vida meu irmão
Você perdeu a sua vida meu irmão"
Essas palavras vão entrar no coração
"Eu vou sofrer as conseqüências como um cão"

Não é que o Santo Cristo estava certo
Seu futuro era incerto e ele não foi trabalhar
Se embebedou e no meio da bebedeira
Descobriu que tinha outro trabalhando em seu lugar

Falou com Pablo que queria um parceiro
E também tinha dinheiro e queria se armar
Pablo trazia o contrabando da Bolívia
E Santo Cristo revendia em Planaltina

Mas acontece que um tal de Jeremias,
Traficante de renome, apareceu por lá
Ficou sabendo dos planos de Santo Cristo
E decidiu que com João ele ia acabar

Mas Pablo trouxe uma Winchester-22
E Santo Cristo já sabia atirar
E decidiu usar a arma só depois
Que Jeremias começasse a brigar

Jeremias, maconheiro sem-vergonha
Organizou a Rockonha e fez todo mundo dançar
Desvirginava mocinhas inocentes
Se dizia que era crente mas não sabia rezar

E Santo Cristo há muito não ia pra casa
E a saudade começou a apertar
"Eu vou me embora, eu vou ver Maria Lúcia
Já tá em tempo de a gente se casar"

Chegando em casa então ele chorou
E pro inferno ele foi pela segunda vez
Com Maria Lúcia Jeremias se casou
E um filho nela ele fez

Santo Cristo era só ódio por dentro
E então o Jeremias pra um duelo ele chamou
Amanhã às duas horas na Ceilândia
Em frente ao lote 14, é pra lá que eu vou

E você pode escolher as suas armas
Que eu acabo mesmo com você, seu porco traidor
E mato também Maria Lúcia
Aquela menina falsa pra quem jurei o meu amor

E o Santo Cristo não sabia o que fazer
Quando viu o repórter da televisão
Que deu notícia do duelo na TV
Dizendo a hora e o local e a razão

No sábado então, às duas horas,
Todo o povo sem demora foi lá só para assistir
Um homem que atirava pelas costas
E acertou o Santo Cristo, começou a sorrir

Sentindo o sangue na garganta,
João olhou pras bandeirinhas e pro povo a aplaudir
E olhou pro sorveteiro e pras câmeras e
A gente da TV que filmava tudo ali

E se lembrou de quando era uma criança
E de tudo o que vivera até ali
E decidiu entrar de vez naquela dança
"Se a via-crucis virou circo, estou aqui"

E nisso o sol cegou seus olhos
E então Maria Lúcia ele reconheceu
Ela trazia a Winchester-22
A arma que seu primo Pablo lhe deu

"Jeremias, eu sou homem. coisa que você não é
E não atiro pelas costas não
Olha pra cá filha-da-puta, sem-vergonha
Dá uma olhada no meu sangue e vem sentir o teu perdão"

E Santo Cristo com a Winchester-22
Deu cinco tiros no bandido traidor
Maria Lúcia se arrependeu depois
E morreu junto com João, seu protetor

E o povo declarava que João de Santo Cristo
Era santo porque sabia morrer
E a alta burguesia da cidade
Não acreditou na história que eles viram na TV

E João não conseguiu o que queria
Quando veio pra Brasília, com o diabo ter
Ele queria era falar pro presidente
Pra ajudar toda essa gente que só faz...

Sofrer...

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Congresso Internacional do Medo

Carlos Drummond de Andrade © Graña Drummond

[drumlyra.gif]

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos. Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços, não cantaremos o ódio porque esse não existe,existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro, o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas, cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte, depois morreremos de medo e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

Verdade

 

Poema de: Carlos Drummond de Andrade

© Graña Drummond

[carica.gif]


A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.


E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.


  

Pintura de Samuka de Sousa


Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.

Era dividida em metades
diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.


Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

 

Postado originalmente em : O Monge Hitech

terça-feira, 21 de abril de 2009

Carinho Triste

Manuel Bandeira

 

A tua boca ingênua e triste
e voluptuosa, que eu saberia fazer
sorrir em meio dos pesares e chorar em meio das alegrias,
a tua boca ingênua e triste
é dele quando ele bem quer.


Os teus seios miraculosos,
Que amamentaram sem perder
o precário frescor da pubescência,
teus seios, que são como os seios intactos das virgens,
são dele quando ele bem quer.


O teu claro ventre,
onde como no ventre da terra ouço bater
o mistério de novas vidas e de novos pensamentos,
teu ventre, cujo contorno tem a pureza da linha do mar e céu ao por do sol,
é dele quando ele bem quer.


Só não é dele a tua tristeza.
Tristeza dos que perderam o gosto de viver.
Dos que a vida traiu impiedosamente.
Tristeza de criança que se deve afagar e acalentar.
( a minha tristeza também!...)
só não é dele a tua tristeza, ó minha triste amiga!
Porque ele não a quer!

 

Manuel Bandeira

quarta-feira, 8 de abril de 2009

A NOITE DO MEU BEM - Dolores Duran (letra)

Dolores Duran

Hoje eu quero a rosa mais linda que houver
E a primeira estrela que vier
Para enfeitar a noite do meu bem
Hoje eu quero paz de criança dormindo
E abandono de flores se abrindo
Para enfeitar a noite do meu bem
Quero a alegria de um barco voltando
Quero ternura de irmãos se encontrando
Para enfeitar a noite do meu bem
Ah! eu quero o amor, o amor mais profundo
Eu quero toda beleza do mundo
Para enfeitar a noite do meu bem
Ah! como este bem demorou a chegar
Eu já nem sei se terei no olhar
Toda pureza que eu quero lhe dar.

A NOITE DO MEU BEM - Dolores Duran (letra)

terça-feira, 7 de abril de 2009

AS ROSAS NÃO FALAM

Cartola

Bate outra vez
Com esperanças o meu coração
Pois já vai terminando o verão,
Enfim
Volto ao jardim
Com a certeza que devo chorar
Pois bem sei que não queres voltar
Para mim
Queixo-me às rosas,
Mas que bobagem
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti, ai
Devias vir
Para ver os meus olhos tristonhos
E, quem sabe, sonhavas meus sonhos
Por fim

AS ROSAS NÃO FALAM - Cartola (letra)

segunda-feira, 6 de abril de 2009

MORTE E VIDA SEVERINA

Composição: Chico Buarque sobre poema de João Cabral de Mello Neto

Esta cova em que estás, com palmos medida
É a conta menor que tiraste em vida
É de bom tamanho, nem largo, nem fundo
É a parte que te cabe deste latifúndio
Não é cova grande, é cova medida
É a terra que querias ver dividida
É uma cova grande pra teu pouco defunto
Mas estarás mais ancho que estavas no mundo
É uma cova grande pra teu defunto parco
Porém mais que no mundo, te sentirás largo
É uma cova grande pra tua carne pouca
Mas à terra dada nao se abre a boca
É a conta menor que tiraste em vida
É a parte que te cabe deste latifúndio
(É a terra que querias ver dividida)
Estarás mais ancho que estavas no mundo
Mas à terra dada nao se abre a boca

 

MORTE E VIDA SEVERINA - Chico Buarque (letra)

domingo, 29 de março de 2009

O Sol que me aquece


Sonhei que vagava no espaço,
perdido, sem luz, sem calor.
Sentia uma tristeza imensa,
vivia com frio, fome e dor.

De repente, não sei de onde,
surgiu uma estrela distante,
com luz tímida, guiando-me
para o seu calor fulgurante.

Eu sabia que sua energia
destroçaria meu corpo,
e seu calor incineraria o resto.

Mesmo assim, sem pensar,
querendo fugir da escuridão,
mergulharei neste teu sorriso.

(humberto o sousa)

sábado, 28 de março de 2009

Hai Kai

 

Olhar esquivo
corpo ondulante
sonho vivo

Eugénia Tabosa

 

As chuvas de maio
enchem de rãs
a minha porta!

Sanpu

 

Fauno enfezado
seduzo menininhas
com flauta de barro.

Simão Pessoa

 

sob a árvore imóvel,
silêncio de pássaros dormindo;
paz na noite.

Alaor Chaves

 

na poça da rua
o vira-lata
lambe a lua

Millôr Fernandes

 

sem um novo dia
nem o cotidiano
existiria

Jandira Mingarell

chegado para ver as flores,
sobre elas dormirei
sem sentir o tempo

Buson
Tradução de Olga Savary

 

Na noite escura
um mar de espuma
chama pela lua

Eugénia Tabosa

 

Minha mão vazia
Esperando a sua
Encontro que cria.

Gabriela Marcondes

 

Te vejo única
te toco tímida
te sinto úmida.

Simão Pessoa

 

Um homem caminha
cabisbaixo e só:
perdeu o que não tinha

Eugénia Tabosa

 

podem tirar tudo da gente
menos a beleza
dessa lua crescente

Ricardo Silvestrin

 

Fonte: www.seabra.com/

sexta-feira, 27 de março de 2009

ROSA DE HIROSHIMA - Vinicius de Moraes

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada

ROSA DE HIROSHIMA - Vinicius de Moraes (letra)

quarta-feira, 25 de março de 2009

Você diria que me ama?

Você diria que me ama?
ignore minhas virtudes,
enalteça meus defeitos,
lembre-se dos vícios,
dos meus esquecimentos.

Se você me ama não diga,
apesar de minha insistência
não diga e aguarde o amanhã,
quem sabe eu fale primeiro.

E quando este amanhã chegar
será o início da felicidade,
da cumplicidade de amantes,
que em fantasias delirantes,
sonharemos com a eternidade.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Eu não sei reagir...

Estava pensando nas coisas cotidianas que acontecem em nossas vidas e que não conseguimos reagir; um governo que diz que não sabia de nada; um ensino brasileiro deficitário; políticos corruptos; e às vezes, um amor que nos invade a alma. E nós, o que fazemos ?
Não conseguimos reagir ao sistema, ao governo, ao amor...
Reclamar mais ? Não, desprendemos muita energia ao criticar o sistema, então, que tal falar mais uma vez do amor?!
Pois este sim, nos motiva a alma, entorpece os sentidos, nos preenche a vida...
Segue mais um "jogo de palavras", que não é um poema, pois não tenho técnica para isso, apenas escrevo com o coração.Perdoe-me os amigos poetas que tenho, maravilhosos, e que acompanham este meu singelo trabalho...

Eu não sei reagir...


Eu não sei reagir!
quando esperas uma atitude
aos teus estímulos de fêmea
revelados em toda sua plenitude

Estímulos de fêmea teus
que norteiam meus pensamentos
paralisando-me a racionalidade
que remetem ao frescor de tua idade

Racionalidade paralisada
incandesce minh’alma
levando-me a quintessência do prazer
mas o que eu, um simples mortal, posso fazer?

Eh! Eu não sei reagir!
não sei se te quero
contudo, não deixo de querer-te em
meus devaneios, eu não sei reagir...

E querendo-a me remeto a questionar:
Oh! Bela mulher o que queres de mim,
que todos os homens do mundo não possam te dar ?
Tu não sabes, também, reagir ?

Nego-te meu amor, carinho e atenção
a vida é assim mesmo, complicada, mas
também, não consegues reagir
descobristes enfim, que amar é não saber reagir!

Ao meu doce amor

Autora: Glauciane Carvalho

Postado originalmente em: http://glaucianecarvalho.blogspot.com

sábado, 14 de março de 2009

Minha vida

Tropeço, caio, levanto
e continuo andando
mas não aprendo
a olhar o chão.
Vivo cometendo
os mesmos erros
tropeçando, caindo,
até não mais me levantar.
Quando este dia chegar,
talvez eu aprenda
a olhar para o chão,
então não poderei mais andar.
Só me restará sonhar
com os dias em que eu
tropeçava, caia e levantava
e continuava andando.

(humberto o sousa)

quinta-feira, 12 de março de 2009

Dois mundos, dois lados


Gosto de vez em quando de brincar com as palavras. Por este motivo, acabo de fazer o que chamo de "jogo de palavras" e não de poesia, pois eu nunca rimo nada. Sou péssima para fazer rimas. Apenas me veio a inspiração e como este espaço tem como objetivo a liberdade de expressão, segue a minha tênue audácia textual:

Dois mundos, dois lados...

Da maturidade, o delírio
a vontade certeira do convívio
dois mundos, dois lados
e o imensurável abismo,
o fundo

O olhar que se despe,
a fantasia que se reveste no formal, no ético
desço, desço, me rebaixo, me entrego
teu cheiro, teu gosto, mas só tenho desprezo

Cresço, cresço
tenho que crescer
mas se crescer é esquecer, menina ei de ser

Anos, anos e à margem do abismo
o reecontro
danos,prantos e em tua pele
as marcas do tempo, não conseguem
escurecer o brilho do teu olhar.

Ah! o teu olhar
que nega incansavelmente o que tuas palavras dizem
prantos, danos
e o infinito desejo da loucura que invade
e arrasa a pele, levemente rubra.

Rubra sim, rubra
da timidez, do pecado, da fúria ardente
que queima, como arde
anos e anos
que passam, passam

Como a brisa fria das lindas noites de inverno
e que no adormecer refletido nos sonhos
entra em erupção o vulcão do desejo,
agora livre...
finalmente livre, que busca o ápice,
o gozo, o murmúrio, os gemidos

Solidão, que solidão
das lindas noites de inverno
apenas a brisa fria, a realidade
era apenas um sonho, um lindo sonho

Agora, da maturidade: a tristeza
da vontade certeira: a angústia da distância que nos une
Dois mundos, dois lados
e o imensurável abismo,
o fundo.

Autora: Glauciane Carvalho

Postado originalmente em: http://glaucianecarvalho.blogspot.com/

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Mascara Negra

Quanto riso oh quanta alegria
Mais de mil palhaços no salão
Arlequim está chorando
Pelo amor da colombina
No meio da multidão

Foi bom te ver outra vez
Está fazendo um ano
Foi no carnaval que passou
Eu sou aquele pierrô
Que te abraçou
e te beijou meu amor
Na mesma máscara negra
Que esconde o teu rosto
Eu quero matar a saudade
Vou beijar-te agora
Não me leve a mal
Hoje é carnaval

(Zé Keti/Pereira Mattos)

Berenice

Deixe de macaquice Berenice,
menina não pula, que tolice.

Berenice não mais pulou,
Berenice não mais brincou.

Deixe de criancice Berenice,
fazer Teatro é burrice,
filha minha faz Direito.

E ela trocou com dor no peito.

Sempre a mesma mesmice Berenice,
papai-e-mamãe é chatice.

E Berenice assumiu a fantasia
que não era sua e lhe dava azia.

Certo dia Berenice morreu,
no rosto um sorriso feliz,
sorriso de quem diz:
pelo menos nisto ninguém palpite deu.

(humberto o sousa)

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Para Lena


Filhos, que bom te-los;
aninha-los no colo
pela primeira vez,
a primeira palavra,
o primeiro sorriso,
os primeiros passos,
nossos sonhos
neles realizados.

Filhos, melhor não te-los?
aninha-los no colo
nas noites febris,
o choro constante
das dores não entendidas,
os primeiros tombos,
a partida,
o medo dos nossos sonhos
não serem cumpridos.

Filhos, é melhor te-los
próximos de nós,
temos medo que nós esqueçam,
que deixem de nos amar,
medo bobo,
nossos filhos precisam voar.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009


amor
amora
amordaça
amortalha

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Reflexos

Eu lhe vi
e o teu olhar refletiu o meu,
eu lhe sorri
e o teu sorriso refletiu o meu.

Bebemos
e a minha sede refletiu em ti,
conversamos
e a minha ansiedade refletiu em ti.

Nos amamos
e você refletiu as minhas carícias,
refletiu a minha paixão,
refletiu o meu prazer,
refletiu a minha alegria
e refletiu o meu cansaço.

Espelho imperfeito sou,
não consigo, com exatidão,
refletir o amor que tens por mim.

(humberto o sousa)

domingo, 4 de janeiro de 2009

quem sou?

Sou o resultado
da soma de pai e mãe,
pai e mãe somam dois,
não sou nenhum dos dois.

Sou o resultado
da soma de avô e avó,
avô e aó somam quatro,
como posso ser um dos quatro?

Sou o resultado
da soma de bisavô e bisavó,
bisavô e bisavó somam oito,
como posso ser um dos oito?

sou o resultado
da soma de ...
os números se perdem,
são tantos ancestrais
que o número beira o infinito.

Quem sou?
sou a soma
de toda humanidade?
Pode me chamar simplesmente de Humano.

(humberto o sousa)